Bar

Hylla K. Werstonem

Desfrutava do calor do sol ao tocar na pele exposta da face, as melenas longas dos cabelos caindo nas bochechas pálidas. Os olhos azuis varreram a entrada da alta estrutura de pedra, fitando uma janela aqui e ali.

A dona daquela morada era sua amiga, e Hylla imaginou que encontrá-la primeiro após longos meses afastada seria uma boa ideia.

Para aquela tarde serena, vestia roupas básicas. Trocara os jeans por um curto vestido de seda escura, enquanto as meias longas de tecido cobriam suas pernas até acima dos joelhos de modo que havia uma pequena parcela de pele das pernas brancas ficavam à mostra entre a barra do vestido e as meias.

Para os pés, optara por um par de botas de salto, cuja a coloração negra entrava em harmonia com as meias da mesma cor. Por cima de todo aquele look, o casaco de brim tecido com cores claras quebrava a escuridão das outras peças, sendo de um marrom que beirava o tom amadeirado; como café quente.

Desta vez, estava desprovida de armas. O par de brincos pequenos enfeitava os lóbulos claros, e as íris azuis como pedaços roubados do céu encaravam a porta fechada à sua frente. Os cabelos longos e livres se moviam como mágica quando tocados pelo vento.

Isabelle a receberia bem depois de Werstonem ter simplesmente sumido do mapa? Tinha conhecimento do temperamento explosivo da amiga, mas no momento era nela que buscava o conforto do lar.

Ainda que Hylla fosse uma traidora.


Subiu os degraus claros da residência de forma vagarosa, os saltos criando uma sinfonia que ela não entendia ao tocarem o piso polido.

Chegou ao primeiro andar da residência ampla, observando uma parte chamativa dali: o bar.

Em uma infinidade de bebidas e taças de vidro e cristal, Hylla se censurou por mais uma vez dar ouvidos à parte de sua mente que lhe induzia ao consumo alcoólico; o vício pela droga ainda agarrava-se nela como uma praga inexpugnável.

Devorou a imagem das prateleiras com inúmeras marcas de bebidas famosas com degustação, se aproximou aos poucos e ocupou um banco pequeno frontal ao balcão de madeira refinada.

Encarou as luzes no teto como se fossem estrelas minguadas, a resistência baixa ao chamado de sua própria fera interior – queria tanto dar só um gole, mesmo que aquilo fosse significar sua danação.

Entretanto, naquele mundo de deuses vingativos e monstros nos armários, tudo o que ela podia fazer era esperar a chegada da Duchanne com um belo Martini em mãos.

I had a dream so big and loud

I jumped so high, I touched the clouds

Hylla K. Werstonem

Encarou as orbes castanhas ao virar de encontro a amiga, com o sorriso se formando nos lábios.

Tirou os cabelos rebeldes que insistiam em cair em seu rosto magro, deixando visíveis as íris de um preciso azul claro. O clima bucólico que se seguiu foi, em sua maior parte, nostálgico.

A filha de Ares era uma amiga de longa data, e o reencontro com a mesma significava também um firmamento de raízes, não só na relação mútua de amizade, mas em relação a si própria.

-Você matou alguém pra conseguir morar aqui? – brincou.

Cruzou as pernas, as mãos repousando sobre o joelho enquanto assentia, respondendo a pergunta anterior de Isabelle.

O incentivo à bebida agora vinha dos dois lados, e Hylla se permitiu tomar apenas um gole.

-Como você está? – indagou ao apoiar os cotovelos no balcão. – E Alecksej, como ele está?

A lembrança do outro semideus a fez latejar com a saudade.

I had a dream so big and loud

I jumped so high, I touched the clouds

Hylla K. Werstonem

-Você fez besteira. – concordou a morena ao analisar a situação que lhe fora descrita. – É comum alguém voltar dos mortos?

Pensou momentaneamente sobre o caso, com uma ruga de preocupação se formando entre as sobrancelhas.

-Ele disse se iria te procurar novamente? – arriscou.

I had a dream so big and loud

I jumped so high, I touched the clouds

Hylla K. Werstonem

-Relaxa. – a morena levantou, com os passos breves a levando pelo lugar. As íris azuladas acharam as orbes da amiga.

Sequer Werstonem estava segura em relação àquilo, mas era necessário passar alguma segurança para a morena. Foi para trás dela no sofá, deixando a taça de Martini em uma mesinha.

Repousou as mãos sobre os ombros de Isabelle, os dedos se apertando na epiderme. Podia sentir os dias de tensão retratados na carne da moça, e a massagem podia aliviar.

-Eu estou aqui. – assegurou Hylla ao sussurrar baixo. – Ele vai acabar voltando de qualquer maneira, já que veio te procurar da primeira vez. E eu adoraria esbarrar com o Alecksej da boate novamente.

Sorriu com o pensamento.

I had a dream so big and loud

I jumped so high, I touched the clouds

Hylla K. Werstonem

O vício primário da bebida agora era seu atual inimigo, e por mais que tentasse resistir a tentação era muito maior. Agora o copo de vidro com a boca larga havia deslizado para o conforto de seus dedos, e degustava da bebida entre os lábios.

-Ah, o que estou fazendo? – sua voz saiu risonha e debochada para si mesma. Virou um pouco mais o copo, de modo que cada vez mais o líquido a invadiu, ardente e ao mesmo tempo delicioso.

-Me lembre de parar de beber antes de cair. – murmurou para Isabelle. – Posso fazer alguma besteira, e nenhuma de nós quer isso.

Sorriu com a memória vaga de tantas outras loucuras praticadas durante o domínio alcoólico sobre ela.

I had a dream so big and loud

I jumped so high, I touched the clouds